Anselmo Mendes nos recebeu em sua casa minhota, na região dos Vinhos Verdes, sub-região de Monção e Melgaço. Era dia de conhecermos melhor os vinhos feitos por um dos mais renomados produtores do Minho e dos maiores especialistas na casta Alvarinho. Fui acompanhado por minha esposa e um casal de amigos. Estava lá também o Nuno Aguiar que auxilia o Anselmo na área de marketing.
Os Vinhos Verdes tem um estilo único, que encontramos apenas em Portugal. São vibrantes, frutados, frescos e leves. Ainda há alguma confusão envolvendo o nome e a cor dos Vinhos Verdes. O nome verde não vem da cor do vinho. Na verdade eles podem ser brancos, tintos, rosados ou espumantes. Existem várias castas brancas e tintas autorizadas para a produção do Vinho Verde. Sendo as principais brancas: Alvarinho, Arinto, Loureiro, Avesso, Azal e Trajadura. As tintas são: Vinhão, Espadeiro, Padeiro e Alvarelhão.
Mas por que Vinho Verde?
É simples, são chamados assim os vinhos produzidos na região demarcada dos Vinhos Verdes, no extremo norte de Portugal, sob regras rigorosas da CVRVV – Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes.
Há também quem diga que antigamente o vinho era chamado Verde porque era feito com uvas que não amadureciam e isso se dava porque as videiras eram plantadas junto às árvores usadas para sua condução (método uveira ou vinha de enforcado), dando seus frutos entre uma grande quantidade de folhagens das árvores e delas próprias. As videiras tinham grande exuberância e produção, mas os cachos não amadureciam convenientemente. Com isso o vinho destas uvas era muito ácido e com baixo teor alcoólico. Outros atribuem o nome à região, que por ser mais úmida, com alto índice pluviométrico, tem uma vegetação verde e exuberante. E também se diz Vinho Verde em alusão à sua juventude.
A Denominação de Origem dos Vinhos Verdes atesta a qualidade dos vinhos da região, mas podemos encontrar também a certificação Indicação Geográfica Minho, que permitem uma maior liberdade sem perder a qualidade.
Dentre todos os estilos e castas os Alvarinhos são os mais famosos e valorizados, tanto que as regras para sua produção são diferentes das adotadas para os demais Vinhos Verdes brancos. Na verdade os Alvarinhos são classificados como Vinhos Verdes só porque são produzido na região dos Vinhos Verdes, porém estão em uma categoria especial. Quando se pergunta aos produtores de Alvarinho: este é um Vinho Verde? A resposta é: é um Alvarinho. Alguns até preferem dizer que é um vinho branco de Monção e Melgaço. Atualmente os Alvarinhos são produzidos com uvas que amadureceram perfeitamente, são secos, com bom volume de boca e o álcool ronda os 13%.
A Alvarinho é a rainha das uvas brancas, na região dos Vinhos Verdes. Tem grande estrutura, que proporciona vinhos ricos, frescos, encorpados e longevos. Sim! Longevos! É comum escutarmos em Portugal: os Vinhos Verdes devem ser tomados jovens e bem refrescados. Eles estão certos, com exceção dos Alvarinhos! Um bom Alvarinho vai longe. Na verdade melhora com o tempo, ganha complexidade e qualidade de aromas sem perder o corpo e a acidez.
Vamos à nossa visita
No alto do terreno onde está a casa de Anselmo nos deparamos com vinhedos plantados em terraços contidos por grandes muros de pedra. Lá estavam os famosos Muros de Melgaço que deram nome ao primeiro Alvarinho produzido por Anselmo Mendes. Também havia uma adega com algumas barricas onde são feitas algumas experiências. Eram Alvarinhos fortificados! São só experiências, mas será que está nascendo um novo estilo? Espero que sim. Quanto mais diversidade melhor.

Muros de Melgaço – Estes muros cercam as vinhas e emprestam o nome ao primeiro Alvarinho de Anselmo Mendes
Enquanto namorávamos “as experiências”, Anselmo separava algumas amostras do seu excepcional trabalho. Eram “apenas” 24 garrafas para provarmos, tínhamos um longo caminho pela frente!
Já instalados na confortável e elegante sala de degustação, demos início aos trabalhos. Afinal, também trabalho nas férias!
Começamos pela linha Muros Antigos, que conta com a participação da Loureiro e da Avesso, as outras duas variedades que tem a preferência de Anselmo.
- Muros Antigos Vinho Verde 2014, um corte de Alvarinho, Loureiro e Avesso. Nariz cítrico, típico. Equilibrado e muito fresco. Excelente para o verão brasileiro,
- Muros Antigos Loureiro 2014 que segue o mesmo estilo com bastante fruta cítrica e frescor,
- Muros Antigos Avesso 2014 com o nariz mais vegetal e mineral. Na boca a acidez se destaca.
Agora uma pequena vertical de Muros Antigos Alvarinho das safras 2014, 2013 e 2012. Também o intruso Contacto 2014 (Alvarinho) para mais uma comparação. Aliás, poder provar estes vinhos lado a lado é uma experiência fascinante. No geral os Alvarinhos são mais encorpados e equilibrados.
- Muros Antigos Alvarinho 2014, mais frutado, cítrico,
- Contacto 2014, Alvarinho um pouco mais vegetal e fresco,
- Muros Antigos Alvarinho 2013, com uma acidez cortante,
- Muros Antigos Alvarinho 2012, mais encorpado e estruturado, de nariz frutado e mais complexo. Se sobressaiu com destaque, confirmando a fama da safra 2012 para os brancos portugueses.
Subimos um degrau na qualidade
Muros de Melgaço 2014, 2013, 2011, 2002 e 1999. Anselmo fez seu primeiro Muros de Melgaço há mais de 25 anos. Fermenta e estagia em barricas de carvalho de 400 litros por 6 meses.
- Muros de Melgaço 2014, ganhou o Grande Premio da Imprensa no ECVS de Lisboa 2015. Ainda jovem destaca fruta de qualidade,
- Muros de Melgaço 2013, é cítrico, fresco e equilibrado,
- Muros de Melgaço 2011, já se percebe como o tempo faz bem aos Alvarinhos. Os aromas da madeira e da fruta se fundem elegantemente, aportando mais complexidade aromática,
- Muros de Melgaço 2002, foi o top desta vertical. Aromas de alta qualidade e complexidade, com destaque para o mineral e um toque de mel. Ótimo corpo e frescor.
- Muros de Melgaço 1999, segue a mesma linha com camadas de mineral e mel. Percebe-se leve oxidação, que provoca, mas não incomoda. Continua fresco e com bom corpo.
Hora de Curtimenta! Safras 2014, 2013, 2012, 2011 e 2007
O Curtimenta ou à moda antiga, macera e fermenta com as películas por 12 a 24 horas e termina a fermentação em barricas de 400 litros, que foram utilizadas no Parcela Única. Sofre batonnage e permanece nas barricas por 9 meses.
- Curtimenta 2014, concentrado, grande estrutura, complexo e equilibrado,
- Curtimenta 2013, um pouco fechado, mas com grande estrutura,
- Curtimenta 2012, em perfeito equilíbrio com a madeira e grande estrutura, meu preferido. Mais uma confirmação da qualidade da safra,
- Curtimenta 2011, com muita estrutura e opulência,
- Curtimenta 2007, passou por 3 dias de maceração, era o menos equilibrado, um pouco “over”, na minha opinião, acho que por isso o Anselmo reduziu o tempo de contato com as películas nas safras seguintes.
Finalmente o Parcela Única!
Safras 2014 (direto da barrica), 2013, 2012 e 2011. Feito com uvas da parcela de maior destaque em qualidade, fermenta em barricas novas de 400 litros, sofre batonnage e estagia nas mesmas barricas por 9 meses. O resultado é um vinho de aromas de alta qualidade e complexidade. Estruturado e longevo. Todos mostraram o cuidado e a atenção que o Anselmo tem com seu ícone e pudemos perceber bem a evolução dos anos safra a safra.
As características de cada uma das safras do Parcela Única que mais se destacaram foram:
- Parcela Única 2014, mais cítrico e mais fresco, ainda muito jovem,
- Parcela Única 2013, mostrando um pouco mais a madeira e bastante frescor,
- Parcela Única 2012, mostra a safra se destacando mais uma vez, com a fruta cítrica dando lugar à fruta de caroço, pêssego, ótima integração com a madeira, equilíbrio, frescor e ótima persistência, num conjunto elegante e de qualidade superior.
- Parcela Única 2011 um pouco mais opulento, destacando mais a madeira.
Os Parcela Única deram um show! Mas não acabou. Ainda provamos:
- Expressões 2014, um vinho com a missão de expressar a Alvarinho, Monção e Melgaço! Fruta, corpo e frescor exuberantes. Ainda jovem, com longa vida pela frente.
- Pardusco 2013, um tinto leve fresco e equilibrado. Deve crescer muito acompanhado de comida.
- Laranja 2015, uma experiência curiosa. Resultado de maceração carbônica sem filtração. De cor laranja turva. Tem aromas cítricos, de fruta tropical e vegetal. Os taninos estão vivíssimos, ásperos. Vamos dar tempo a ele!
Depois desta maratona, hora de almoçar, mas antes amaciamos a boca com alguns Alvarinhos fortificados. Sim, experiências de um enólogo inquieto e curioso. Direto da barrica, um doce outro meio seco e um sequíssimo como um Jerez. Faço votos que se tornem comerciais!

Rodrigo Vieira (Viver Vinhos), Anselmo Mendes, Nuno Aguiar e José Alexandre Pereira (esq. para dir.)
Pegamos algumas garrafas abertas da prova e fomos para o restaurante Os Pirús na Espanha, logo do outro lado do Rio Minho. Começamos com tapas, inclusive o delicioso pulpo a la gallega, um dos meus preferidos. Seguimos com carne de boi a la plancha, simples, muito saboroso e bem feito. Os brancos acompanharam super bem. Destaque para o Muros de Melgaço 1999 que se mostrou muito gastronômico. Aquele toque de oxidação deixou de ser dúvida e ganhou minha simpatia. Teve também um intruso que fez bonito, o Quinta das Bágeiras tinto Garrafeira 1997, mais um grande vinho português.
Hora de partir? Não!! Hora de visitar a adega e provar os 2015 direto dos tanques de inox. Anselmo está com altíssimas expectativas em relação à safra 2015. Por enquanto estima-se que será superior à 2012, uma das melhores dos últimos anos. Ficamos na torcida!!!
Que Anselmo Mendes continue este trabalho espetacular, nos proporcionando grande prazer a cada desarrolhar de suas garrafas. Que venham as novidades e que elas sigam o mesmo caminho, o do sucesso!
Bom, chega de trabalhar. Hora de pegar a estrada. Próxima parada Valença do Douro! As férias continuam!